Estivemos visitando um importante posto de greve dos caminhoneiros ontem e hoje, na Palhoça (SC). Confirmamos algumas impressões e relatos: a categoria está muito mobilizada, tem apoio de setores muito diversos da sociedade e não está pensando no fim da greve. Quem tá puxando a luta são trabalhadores muito precarizados, embora tenham apoio de grande parte do empresariado. A categoria tem um rechaço muito forte à toda a mídia corporativa, especialmente a Rede Globo. Chega doação o tempo todo, gente passa buzinando, muitos carros com bandeiras e escritos em apoio aos caminhoneiros. Apesar do apoio formal de praticamente toda a esquerda, nos dois momentos em que estivemos lá não vimos mais nenhum militante organizado da esquerda junto (mas sabemos que tem gente se organizando para isso).
Acredito que dois dilemas são fundamentais nos rumos da greve.
Um deles diz respeito à pauta principal das condições de trabalho e de vida (preço do diesel, pedágio, etc). As falas e reivindicações estão girando muito em torno da redução dos impostos, o que interessa aos patrões, mas não vai resolver a alta de preços e vai certamente gerar falta ainda maior de investimentos em direitos sociais. Há caminhoneiros pautando a mudança na política de preços da Petrobrás, mas parece que eles ainda estão em minoria.
O outro dilema é o horizonte político para além do Fora Temer, que é consensual. A defesa de uma intervenção militar está bem presente, mas surge geralmente de forma externa, a partir de setores de extrema-direita que estão lá o tempo todo. Em geral, são aposentados e aposentadas de classe média-alta, que podem ser facilmente distinguidos da categoria. A adesão ativa da categoria aos militares varia muito em cada lugar, mas tem apoio significativo entre caminhoneiros na Palhoça, onde há várias faixas e escritos em caminhões sobre essa pauta. Quem levou esses materiais foi a extrema-direita organizada, mas tudo indica que há espaço para outras faixas de apoio com nossa perspectiva política, coisas como “toda força à luta da classe trabalhadora”, “Petrobrás a serviço do povo”, “fora Pedro Parente”, “intervenção popular já”, etc.
As propostas dos patrões (reduzir impostos) e da extrema-direita (intervenção militar) não possuem qualquer perspectiva de resolver a pauta da greve. Os militares não iriam enfrentar os interesses dos acionistas estrangeiros para abaixar os preços. Esse debate está em aberto para ser feito com a categoria e considero que há espaço para isso.
Enfim, acho que os resultados e consequências dessa greve precisam ser disputados e abaixo proponho algumas formas.
1. A pauta concreta são os custos de trabalho e de vida dos caminhoneiros, uma reivindicação com potencial de atingir toda a classe trabalhadora. Com a dimensão que a luta tomou, existe um risco de se perder essa pauta na discussão pelo horizonte político, entre “Fora Temer”, “Intervenção Já”, “Eleições Já”, etc. Assim como em junho de 2013, quando a esquerda teve que fincar o pé no tema das tarifas (e conquistou a gigantesca vitória de baixar a tarifa em mais de 100 cidades), penso que temos que lutar para manter a pauta do preço dos combustíveis e outros custos dos caminhoneiros. A greve precisa alcançar vitórias materiais.
2. A participação da esquerda junto aos pontos de greve é importante, mas precisa ser feita de forma coletiva e qualificada, a partir dos sindicatos, entidades e movimentos sociais. Apoio de verdade é levar comida, bebida, ajudar com a infraestrutura, logística, ajudar com mídia, divulgação e contatos internacionais. Ao contrário da extrema-direita, que tenta colonizar o espaço sem escrúpulos, colocando suas faixas e gritos por cima das reivindicações da categoria, a esquerda precisa estar lá garantindo a autonomia da categoria, que não pode ser tratada como gado. O objetivo lá é questionar as pautas da redução de impostos e da intervenção militar, dialogando para mostrar que elas não vão resolver as necessidades da categoria e, nesse processo, desmascarar a extrema-direita e os patrões oportunistas.
3. Mais importante ainda do que estar lá é a esquerda se mobilizar em seus espaços de atuação, com solidariedade à greve, mas colocando a sua agenda política nesse momento de confusão nacional. Essa agenda mínima inclui a mudança da política de preços da Petrobrás; a defesa da Petrobrás pública e a serviço do povo; e o repúdio ao governo neoliberal de Temer, repúdio à repressão da luta e às saídas autoritárias representadas nos militares. Quem é trabalhador sindicalizado, precisa cobrar seus sindicatos imediatamente para entrar em solidariedade e puxar greves (nas escolas e universidades também). Mobilizações nos bairros e atos com as nossas pautas também são fundamentais e podem ser organizados através dos movimentos sociais e organizações de esquerda.
Quem não for pra disputa vai ver a história passando batida e ela dificilmente vai virar pro nosso lado sozinha.
Por JG.